Colunistas, Diversos, Rafa Boban

Faz amor por amor à Seleção?!?!

O que é que futebol tem a ver com a natalidade?

No pensamento retrógrado do macho português, onde o futebol era mais que uma religião, talvez fizesse sentido ver uma ligação entre futebol e natalidade.

Quando o time do “macho” vencia, o “macho” chegava todo feliz a casa e logo fazia o amor com a esposa. E fazendo mais amor (na altura sem contraceptivos), havia uma grande probabilidade de aumentar a natalidade… Mas havia o outro lado obscuro dessa realidade que era também comum no tempo dos meus bisavós e avós. Quando a equipa do “macho” perdia, o macho embebedava-se, chegava a casa e batia na mulher. E depois queria fazer amor (e fazia… estupro da própria esposa). As taxas de natalidade realmente eram altíssimas mas era uma realidade sombria… Felizmente acredito ou quero acreditar que essa não é mais uma realidade!

Daí a grande surpresa e choque ao ter visto o novo anúncio publicitária da MEO, uma empresa de telecomunicações e patrocinadora oficial da Federação Portuguesa de Futebol. A exatamente 9 meses do arranque do Euro 2024, o mote da surpreendente campanha é essa:

“FAZ AMOR POR AMOR À SELEÇÃO”

A MEO durante o anúncio encoraja mesmo os portugueses a terem um bebé a tempo de gozarem da licença parental durante a Eurocopa, a junho de 2024!!!

Ora, ora… De facto, contrariando as estatísticas do passado, Portugal regista atualmente uma das mais baixas taxas de natalidade da União Europeia mas olhando para as condições socioeconómicas do país, seria uma loucura e uma irresponsabilidade se assim não fosse.

E é nesse sentido que eu consigo entender a grande quantidade de vozes indignadas com esta campanha.

A promessa de gratuidade de três meses de Sport Tv (canal privado que cobrirá os jogos da Eurocopa) para os “mais certeiros” (isto é, para os que nascerem durante o período da competição) é um insulto para um país em que:

–  o desemprego jovem anda nos 17%;

– seis em cada dez jovens têm vínculos laborais precários;

– 95% dos jovens portugueses vivem com os pais;

– os jovens saem de casa dos pais em média aos 29,7 anos.

Uma sociedade madura sabe o quanto custa monetariamente ter um filho… Eu sei-o na pele!

Com salários vergonhosos e uma taxa de inflação assustadora, as dificuldades financeiras geram stress, desestruturam famílias ao mesmo tempo que a segurança social está à beira do colapso… Será que o futebol pode reverter esse quadro e salvar tudo?

Será que as pessoas que estão desgastadas de se matarem e fazerem todas as ginásticas de forma a pagar as contas, vão ter disponibilidade para fazer sequer amor? Será que as pessoas vão esquecer o difícil dia-a-dia e fazer amor por amor à seleção?

Já ouvi várias pessoas dizerem que pensar em ter filhos nesta conjuntura roça a loucura mas bem… Com três meses de SportTV gratuita, com certeza vão mudar de opinião, isso vai fazer toda a diferença!

Claro que estou a ser irónico. Num país com um quadro económico preocupante, e onde 10% dos casais é infértil, esta campanha só pode ser uma piada de mau gosto.

Se fizerem amor, que façam por amor pelo outro, não por mais ninguém, nem pela licença parental para assistirem uns jogos de futebol. Porque se não se protegerem, vem aí uma aventura, não para três semanas nem para três meses, mas sim para toda a vida.

Rafa Boban | @revista.lebre

Related Posts

Leave a Reply

Your email address will not be published. Required fields are marked *